Camuf Macapá acredita na recuperação do homem agressor e aposta na restauração das famílias
A rede de atendimento à mulher é composta por diversos órgãos que, entre si, realizam interface para dar sequência aos processos envolvendo violência, abuso e outras ocorrências. O Centro de Atendimento à Mulher e à Família (Camuf) se diferencia por acolher mulheres vítimas de violência doméstica e seus familiares, incluindo o companheiro, mesmo na condição de agressor.
Durante entrevista ao programa Justiça por Elas – que vai ao ar todas as terças-feiras pela Rádio Universitária 96.9 FM, das 15 às 16 horas –, a coordenadora do Camuf Macapá, Patrícia Palheta, detalhou essa frente de atuação.
“Não se pode tratar nem “vitimizar” apenas a mulher, considerando que, na maioria das vezes, o homem é o causador da violência e por isso também precisa ser tratado”, explicou. “Temos que dar um olhar de igualdade, porque há muitos homens que sequer têm consciência de que estão praticando violência. Quando explicamos o que é violência psicológica, por exemplo, eles até se surpreendem”, relatou a coordenadora.
Como exemplo desse tipo de violência, ela conta que é muito comum o homem se dirigir à mulher com expressões como “você é burra”, “você não vale nada”, “ninguém vai te querer com três filhos” entre outras.
A sociedade enxerga o homem como “agressor”, mas o Camuf busca entender que por trás da agressão existe um histórico familiar. “Esse homem já foi criança e provavelmente conviveu com um pai alcoólatra e violento, com uma mãe submissa ou, ainda, ele próprio pode ter sido vítima de violência ou abuso”, explica Patrícia. “Em determinado momento da sua vida adulta, esse homem acaba reproduzindo o comportamento violento que aprendeu na infância, e é em razão desses fatores que o Camuf busca tratar esse homem para que não reincida em práticas abusivas contra sua família”, complementou.
“Alguns desses homens, ao serem atendidos, dizem coisas como: ‘Que bom que existe um lugar onde podemos ser ouvidos’”, conta a coordenadora.
Segundo ela, no primeiro contato com a instituição, eles chegam “armados”, considerando que se trata de mais uma instância para julgá-los e condená-los. Mas, a partir do momento que entendem o papel da instituição, passam a colaborar com os procedimentos.
“Tudo começa com o acolhimento, uma espécie de escuta quando a pessoa relata todo o problema pelo qual está passando”, explicou Patrícia. “O segundo passo é uma entrevista com a assistente social, que verifica a situação socioeconômica e em seguida entra em cena a psicóloga, com quem o homem passa por uma atendimento sistemático”.
Em paralelo a tais atendimentos, é realizada também uma Oficina de Homens, um grupo de auxílio onde são trabalhadas coletivamente todas as questões que envolvem a situação de violência na qual ele está inserido.
“Na oficina todos estão inseridos no mesmo contexto. Nela trabalhamos sem questionamentos ou acusações, sem preconceitos, de forma que esse homem se sinta à vontade para reconhecer que praticou a violência”, comentou. “É a partir deste momento que ele reconhece o erro e abre o caminho para uma mudança de atitude”, explicou Patrícia.
“Se eu tivesse conhecido o Camuf antes, não teria agredido a minha mulher”, é uma das falas mais comuns entre os homens que passam pelo atendimento na instituição, de acordo com Patrícia.
“Os resultados são muito positivos, pois em nenhum momento os profissionais do Camuf interferem na decisão do casal sobre permanecer juntos ou separados”, garantiu. “Nós trabalhamos para que as pessoas tenham relacionamentos saudáveis. Que cada um se reconheça e busque sua própria felicidade”, acrescentou.
Advogada do Camuf Macapá, Márcia Rabelo, explicou que não só as mulheres são agredidas. “Temos casos de homens que são agredidos pelas mulheres, também”.
“O que precisa ser mais esclarecido é que a violência não é só física, não é apenas quando deixa marcas no corpo. Há mulheres que nunca levaram um tapa, mas chegam até nós anuladas de tanta violência psicológica e moral”, concluiu.
Outra situação que preocupa o corpo técnico do Camuf é o crescente número de casos de estupros na capital. Só em 2017, cinco adolescentes foram estupradas em paradas de ônibus na zona norte de Macapá, todas localizadas no entorno da Rodovia Tancredo Neves e BR 210. Esses crimes ocorreram em horários incomuns como 07h30 ou 18 horas.
Em casos de violência sexual, é habitual que o acusado negue a prática. A coordenadora do Camuf narra que os profissionais da instituição têm que agir com muita habilidade para que esse agressor assuma a ocorrência, assim dando subsídios seguros para que a polícia dê prosseguimento ao inquérito. Há situações em que a vítima demora mais de dez anos para denunciar, o que torna ainda mais complexa a apuração dos fatos.
Há uma circunstância recorrente e que chama atenção da equipe do Camuf. “São os casos de meninas que são abusadas ou violentadas por volta dos 12 anos e são entregues pela própria família ao abusador”, lamentou a advogada Márcia.
“Essas meninas passam a ser abusadas até a vida adulta, como resultado concebem filhos e somente quando conseguem se libertar é que fazem a denúncia”.
“Esse agressor dificilmente será punido”, explicou, acrescentando que “nesses casos, o que a instituição pode fazer é dar suporte à vítima para tentar minimizar as consequências psicológicas dessa vivência”.
Patrícia Palheta e Márcia Rabelo deixam claro que o papel do Camuf não é o de atenuar a punição aplicada aos considerados culpados pela Justiça nos casos de violência ou abuso, mas o de intervir com atendimento psicossocial para que esses homens não cometam mais os crimes. “É bom evidenciar que esse homem, quando chega ao Camuf, não vem voluntariamente, mas vem porque a Justiça o obrigou”, enfatizou a advogada Márcia.
Defrontar diariamente com situações extremas exige dos profissionais do Camuf um preparo emocional muito grande. “Às vezes os colegas entram chorando na minha sala, diante de um cenário doloroso que acabam de enfrentar”, comentou Patrícia.
“Eu digo, respire, beba um copo d’água e retorne porque o usuário precisa do seu atendimento”, acrescentou.
“Não é fácil, mas precisamos manter algum distanciamento e compreender que nosso papel tem limites. Precisamos assimilar que vamos fazer todo o possível, dar o melhor de nós para contribuir com aquele usuário, mas que o problema não pode se tornar nosso, pois não podemos levá-lo para casa”, concluiu Patrícia Palheta.
- Macapá, 13 de junho de 2017 -
Assessoria de Comunicação Social
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- Criado: Quarta, 14 Junho 2017 00:28