Ação na pandemia: Juizado Sul decide que é o morador e não o síndico quem define se o serviço a ser realizado no apartamento é ou não essencial
Os limites entre os direitos e os deveres de uma pessoa são continuamente testados no dia a dia, com frequência no âmbito da convivência condominial. Em uma situação atípica, como é a pandemia em que o mundo se vê há cerca de um ano e dois meses, novidades se inserem neste contexto. Foi o que ocorreu em um Condomínio de Macapá, quando um morador sentiu-se violado em seu direito de contratar e receber serviço técnico que julgou essencial para o bem-estar e saúde de sua família dentro a intimidade de sua residência, em maio de 2020. E assim procurou o Juizado Sul, quem tem como titular o juiz Naif José Maués Naif Daibes.
Segundo consta no processo de número 0020358-27.2020.8.03.0001, Ação Anulatória de Sanções Condominiais com Pedido Liminar concomitante com Dano Moral e Obrigação de Entregar Documentação, julgado pelo titular da 6ª Vara do Juizado Especial Cível – Sul (Comarca de Macapá), juiz Naif José Maués Naif Daibes, na intenção de manter o cumprimento das normas referentes ao estado de lockdown decretado no primeiro semestre de 2020, a direção do condomínio impediu a entrada de um técnico eletricista da escolha de um morador para proceder com a troca de uma lâmpada led na cozinha de sua residência – necessária ao bom preparo das refeições de crianças com alergias alimentares, como é o caso.
Sentindo-se ferido em suas liberdades, o condômino chamou a Polícia Militar, que não se julgou competente para lidar com a situação – mas sua mera presença inibiu a proibição feita pelo síndico e vice-síndico, o que permitiu que o morador adentrasse as estruturas do condomínio e procedesse com o reparo. Mas não sem aplicar, segundo os autos, multa de R$ 931,67 no morador, sem oferecer oportunidade de ampla defesa e argumentando que as normas que o Decreto Estadual do Lockdown e um ato do próprio condomínio determinavamo impedimento de acesso de terceiros no espaço devido à pandemia da covid-19.
A ação em questão é pedido de tutela liminar que pede, entre outros itens: suspensão de cobrança de multa até resolução do mérito; anulação da multa e notificação do autor; condenação dos requeridos ao pagamento de R$3.000,00(três mil reais) a título de Dano Moral causado a parte Autora; e a entrega da documentação (cópia integral do Regimento Interno do Condomínio, sob pena de multa diária em R$500,00 (quinhentos reais) até que esta seja entregue.
Segundo o magistrado, em sua decisão, a aplicação da multa sem que haja um ato em que se contemplo a versão do morador multado, configurou-se “(...) violação da garantia ao contraditório, cuja substância reside na compreensão de que ninguém pode ser condenado de surpresa e não em antes ter assegurado o direito de controverter a acusação (...) falha indesculpável do condomínio, pois a irregularidade imputada ao autor foi apurada e consolidada sem que ao menos algum tipo de processo administrativo tenha sido instaurado”.
Apesar de em sua sentença o magistrado não ver má fá da parte da diretoria, mas talvez um excesso de zelo, verificou que o ato do condomínio se mostrou ainda mais restritivo e rigoroso que o decreto estadual. Consta nos autos que “a pretexto de baixar norma interna que assegurasse entre os condôminos o cumprimento do Decreto Estadual, a Administração do condomínio foi além, excedendo-sena criação de restrição adicional que o ato estadual nem ao menos previu, pois enquanto o normativo público admitiu o acesso às residências e condomínios nas hipóteses de atividades ou serviços essenciais, o Ato Normativo 003/20 limitou o acesso aos casos de extrema urgência, alternativa que nenhum dos Decretos estaduais já editados ao longo da pandemia jamais considerou”.
O magistrado reitera, nos autos, o que a lei diz sobre até onde vai a autoridade do síndico em situações como esta. “E aqui vale lembrar que síndico e vice-síndico são senhores das áreas comuns, mas não das áreas privadas representadas pelos apartamentos, de forma que qualquer restrição ao livre exercício do direito de propriedade e de autonomia em relação ao imóvel habitado há de ser feita pela lei e não por um ato interna corporis do condomínio, seja porque o síndico não possui competência legal para tanto, seja porque a todos é assegurada a garantia constitucional de somente ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa em virtude de lei”, diz o juiz em sua decisão.
Ao final da sentença, ao entender que é o morador e não o síndico quem decide se o serviço a ser realizado em seu imóvel é ou não essencial, o magistrado julgou procedente o pedido anulatório da multa aplicada emdesfavor do autor e condenou o condomínio a ressarcir ao requerente o valor de R$931,67 (novecentos e trinta e um reais e sessenta e sete centavos), corrigido monetariamente pelo INPC e acrescido de juros legais à taxa de 1% ao mês, ambos devidos desde 07 de julho de 2020 (data do pagamento).
Julgou procedente ainda o pedido obrigacional e tornou definitivo o efeito da tutela que antecipou a entrega do regimento interno do condomínio, mas julgou improcedente o pedido de danos morais e o pedido contraposto, determinando que a ação não teria custas ou honorários, por não ser verificada má-fé.
- Macapá, 19 de maio de 2021 -
Assessoria de Comunicação Social
Texto: Aloísio Menescal
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- Criado: Quarta, 19 Mai 2021 09:21